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Conversa de Pista: Um novo eldorado para os pilotos brasileiros

Por Wagner Gonzalez

Negrão, segundo brasileiro a conquistar o título mundial da categoria LMP2. Primeiro foi Bruno Senna (ACO)

A Fórmula 1 continua sendo a meca de 11 entre 10 jovens que dão seus primeiros passos no kart, não raramente por desejo maior dos pais do que dos próprios neófitos no esporte. Em tempos de ruptura com padrões pré-millenials esse objetivo vem sendo desconstruído e ganhando adeptos em ritmo de Q-3, a fase decisiva dos treinos de classificação e que define quem vai largar na pole position. A conquista do título de Campeão Mundial de Resistência na categoria LMP2 por André Negrão e a segunda vitória de Daniel Serra nas 24 Horas de Le Mans, na categoria GTE Pro, certamente darão um novo estímulo ao automobilismo brasileiro, ausente da F-1 e com perspectiva de um retorno próximo pouco animadora. Esse estímulo se materializa tanto no mercado de pilotos quanto no crescimento da categoria Endurance em pistas nacionais e o resultado de tudo isso são boas possibilidades de profissionalização para os pilotos.

Para amantes de tabela Excel e chegados a analisar tudo por números frios em um esporte onde a paixão e o inesperado têm maior valor que os cálculos de engenharia tão essenciais, essa análise desemboca no tamanho do mercado de pilotos entre as duas modalidades. Some-se a isso o interesse cada vez maior das grandes fábricas de automóveis, ávidas de lucros em nichos outrora avaliados com parcimônia. Produzir e desenvolver carros de competição derivados de modelos de rua vai muito além de ganhos intangíveis com construção e consolidação da imagem de marca e passa pelos lucros puros e simples da venda e manutenção desses carros. A Lamborghini, por exemplo, já faz até leasingde carros de corrida.

As grandes marcas têm envolvimento com as corridas de resistência com equipes privadas ou semi-oficiais (ACO)

Para os entusiastas de plantão, a chance de ver carros de marcas diferentes, e bastante semelhantes ao que se pode ver nas ruas em fins de semana ensolarados, justifica o interesse por corridas que reúnem Aston Martin, BMW, Corvette, Lamborghini, Mercedes, Porsche e outros dividindo pistas mundo afora com protótipos de várias cores e raças. O último fim de semana reforçou esse novo panorama em frentes tão diferentes quanto a maior prova de resistência do mundo, as 24 Horas de Le Mans, e mais uma etapa do Endurance Brasil, torneio que replica esse universo na terra brasilis e que vive uma nova fase de crescimento. Tanto um quanto outro desses dois planetas são personagens dessa fase, o primeiro por pressões políticas advindas da F-1 e o segundo pelo formato adotado e a perene instabilidade econômica do País.

Após tentar carrreira nos monopostos André Negrão se consagra nas provas de Endurance (Alpine)

Em Le Mans André Deco Negrão (filho do ex-piloto Guto Negrão) terminou a prova em sexto lugar na classificação geral e primeiro na categoria LMP2 conduzindo um Alpine,  o que garantiu a ele e aos franceses Nicolas Lapierre e Pierre Thiriet o título mundial mais disputado do campeonato. Os carros da LMP1 são mais rápidos e dominem a classificação geral, mas a Toyota corre praticamente sozinha em termos ao equipamento e orçamento: somou 216 pontos contra 134 da Rebellion Racing, onde corre Bruno Senna. A equipe de Negrão chegou ao título após aculular 181 pontos, contra 166 e 138 dos seus adversários mais diretos (dois carros da equipe Jackie Chan DC Racing) e 117 da Dragon Speed.

“Foi uma temporada e, principalmente, uma corrida muito dura. Nossos adversários não deram folga e não podíamos cometer nenhum erro durante as 24 horas da prova e durante a noite o carro de segurança ficou entre nós e o protótipo da equipe G-Drive. Cheguei a pensar que isso definiria o resultado, mas conseguimos recuperar a liderança na re-largada.”

Espécie de patinho feio da família Endurance, a LMP2 deve ser suplantada em importância pelos carros das categorias GT tanto na Europa quanto na América do Norte e na Ásia, onde proliferam campeonatos e torneios que servem de eliminatórias para uma vaga em Le Mans, o Santo Graal dessa religião de pneus largos e motores a combustão. Motores híbridos, por enquanto, apenas na LMP1 e, em breve na categoria Hyper cars. É na categoria GT que mais brasileiros brilharam no circuito de Sarthe, região situada a oeste de Paris. Daniel Serra foi o vencedor entre os belos GT da classe Pro e Felipe Fraga conseguiu resultado semelhante na classe AM. Uma não-conformidade na capacidade do tanque de gasolina, porém, causou a desclassificação dos Ford GT da equipe do brasileiro (Keating Motorsports) e da Chip Ganassi.

Daniel Serra conseguiu sua segunda vitória em Le Mans com este Ferrari da equipe semi-oficial (ACO)

Daniel Serra venceu na categoria LM GTE Pro a bordo de um Aston Martin Vantage em 2017 e agora repete o feito a bordo de um Ferrari. Atual bi-campeão da Stock Car brasileiro, onde seu pai Chico Serra foi tri-campeão em 1999/200/2001, ele não esconde que o resultado deste ano teve sabor especial:

“A primeira vitória é realmente uma conquista inesquecível, mas vencer a bordo de um carro vermelho tem um significado diferente, marcante.”

Fraga venceu com este Ford GT à vitória na classe GTE AM, mas tanque irregular causou desclassificação (ACO)

Além de André Negrão, Bruno Senna (4colocado na geral e na categoria LMP1), Daniel Serra e Felipe Fraga também participaram das 24 Horas de Le Mans deste ano Augusto Farfus (BMW M8 GTE, ficou em 31o), Pipo Derani (Ferrari 488 GTE, 42o) e Rodrigo Baptista (Ferrari 488 GTE, 34o). Derani é o líder da categoria principal no campeonato IMSA, disputado na América do Norte, onde faz dupla com outro brasileiro, Felipe Nasr e Hélio Castro Neves defende a equipe Honda; Bia Figueiredo, Oswaldo Negri e Victor Franzoni também participam esporadicamente. No Japão João Paulo de Oliveria disputa a categoria Super GT com um Aston Martin e ainda na Europa vários brasileiros participam de séries como a Blancpain GT, entre eles Felipe Fraga, enquanto Allam Khodair e Marcelo Hahn disputam o Europeu de GT.

MRX-Lamborghini (E), Ginetta e AJR são os bichos papões da Endurance brasileira (Bruno Terena)

No Brasil o Endurance vive uma nova fase de bonança graças ao entusiasmo de pilotos, equipes e construtores. Formada em torno da cena gaúcha da categoria, a lista de inscritos é dominada pelo piloto e construtor Juliano Moro com seus protótipos AJR, de conceito similar ao usado nos Estados Unidos, e já provocou o interesse da Ginetta, construtor ingles que tem no brasileiro Adolpho Rossi seu maior representantes nas Américas: foi ele quem lançou e consolidou a marca nos Estados Unidos. Há também propostas desenvolvidas por Luiz Fernando Cruz (MRX Lamborghini) e pelos engenheiros Evandro Flesch e Pedro Fetter (Sigma-Audi). O mecânico Adilson Asa Ayres também desenvolve uma nova proposta para a categoria. Entre os GTs as marcas Audi, Ferrari, Lamborghini, Mercedes e Porsche também participam com destaque.

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